Estamos preparados para sermos bons pais?
Os pais não se tornaram pais de repente, num estalar de dedos. Vão-se tornando pais aos pouquinhos e, tornar-se pai, ou mãe, exige trabalho, tolerância, às vezes esforço e sempre uma boa dose de amor.
Sim, todos nós sabemos que tornar-se pai e crescer, não acontece à margem da transformação e, por vezes, alguma dor. Mas, nem todos estamos preparados para as transformações que tornar-se pai, ou Mãe, exige. E, muitas vezes, os pais vão nascendo para a parentalidade aos soluços, como que ‘chutados para canto’ pelo que sentem, pelas dicas das famílias de origem e dos amigos que já foram pais. Ao tornarem-se pais, vão sentindo que perdem o controlo, vão sentindo a responsabilidade e, a par dela, o medo de errar, de não serem suficientemente bons.
E, abalados por tudo isto, os pais esquecem-se que, regra geral, têm o equipamento básico necessário para serem bons pais, mas, tolhidos por estes ‘chutos para canto’, e pelas experiências enquanto filhos, vão acumulando cicatrizes que teimam em não sarar e que, por vezes, turbam o olhar mais intuitivo e atento de um pai. Por isso, é essencial que independentemente da forma como somos pais, e como crescemos em direção ao amor de um filho, nunca nos esqueçamos que a função primordial dos pais, é ser um abrigo, para onde, no limite, um filho se pode direcionar, serenar e crescer.
Para conseguir ser um verdadeiro abrigo, um pai precisa de se libertar de tudo aquilo que aos poucos o está a condicionar no exercício da parentalidade, olhar para dentro de si e conseguir separar o filho que foi, os pais que teve e o pai que se está a tornar. No fundo, um pai precisa de permitir-se a sarar as suas feridas enquanto filho, permitir-se a sentir, a seguir o seu instinto e colocar-se em posição de transformação. Para, a partir daqui, com lucidez e sabedoria, conseguir traçar as regras e a direção base a um filho e, logo a seguir, lhe permitir ser ele próprio e fazê-lo sentir que, independentemente daquilo que consegue, é amado por aquilo que é!
Para além de tudo isto, um pai não se deve esquecer que ainda que, haja pontos comuns em ser pai, não há fórmulas mágicas para a parentalidade, que resultem com todos os pais, por isso, é na pluralidade que reside a essência da paternidade, cada pai à sua maneira encontra o seu jeito de Ser. E, desde que parta para a parentalidade consciente das suas fragilidades, com os instintos apurados e as feridas, tendencialmente, cicatrizadas, temos espaço para que, ao seu jeito, todos possam ser bons pais.
Um artigo das psicólogas clínicas Cátia Lopo e Sara Almeida da Escola do Sentir, outubro 2020.